Páginas

quinta-feira, 14 de março de 2013

Um "Conto" JINA II



Em rápida recapitulação sobre a primeira obra novelesca do mundo, tanto no mérito quanto no Tempo, digo duas palavras acerca do conto mais genuinamente Jina que ela contém, a saber: o do príncipe Camaral-zamam e a princesa Badura, onde convivem homens, fadas e gênios.

O príncipe Camaral-zamam, por não querer contrair um matrimônio de Estado, foi feito prisioneiro por seu pai, como o Segismundo de Calderón, em torre solitária. A fada Mainuma surpreende-o dormindo; e admirada de beleza tão sobre-humana, comunicou seu assombro a um gênio amigo, que lhe disse:

 — Por muito belo que seja o príncipe persa, infinitamente mais bela é minha princesa Badura, a qual, por análogas resistências a quantos casamentos de conveniência seus pais quiseram impor-lhe, também vive enclausurada, em exilo estreito, longe de todo olhar humano.

— És um insensato, irmão gênio, só com o intento de fazer-me acreditar que tua princesa tenha quando muito a metade da formosura de meu príncipe.

   E assim, travou-se terrível discussão entre a gentil fada e o teimoso gênio. Para termina-la de vez, resolveram colocar o príncipe e a princesa, lado a lado, durante o sono de ambos. Mas a discussão tomou aspecto grave, porque, mesmo vendo-os untos e adormecidos, fada e gênio mantiveram a discussão a respeito daqueles tipos de beleza.

— Então vamos dar o prêmio de formosura a um dos dois que tenha maior beleza moral, isto é, àquele que, desperto, se mostre mais terno e amoroso, já que não existe no mundo beleza comparável à imarcescível beleza do coração.

   E assim ficou bem combinado. 

   Emparelhado sob mágico meimendro, dormiam um ao lado do outro os dois príncipes, mas eram despertados alternadamente. Então observa-se tais provas de supremo amor de um a outro, da maneira mais casta, que a duvida ficou de pé, como a princípio. Inútil é acrescentar que ambos já despertos e cada qual em seu reino, aliás, distantes entre si de mil léguas, confessaram de igual modo os acontecimentos maravilhosos aos seus respectivos pais. 
 Mas o problema que subjugava os dois amantes parecia insolúvel. Como a princesa poderia tornar a ver o seu príncipe encantado?

   Aqui o conto descerra uma série de aventuras, todas iniciáticas e todas com o sabor de lendas, (Que podes achar admiravelmente descritas no texto em questão) até o dia em que, depois de várias peripécias e de múltiplos conflitos, os dois namorados puderam ver-se abraçados e unidos por laços felicíssimos.
   
   Meu propósito ao recordar a formosa lenda oriental não vai mais adiante, pois limita-se apenas a sublimar um dos fatos singulares e inexplicáveis, que sempre precede o verdadeiro amor e que se resume no famoso ditado castelhano: “do céu calha casamento e mortalha”. Na verdade, ambos dependem por certo do misterioso jogo do destino, que o vulgo chama casualidade...
   
   
   Por que desconhecida lei orgânica pode iniciar a puberdade, tanto em um como no outro sexo, com sonhos premonitórios, de emotividade inenarrável, como se neles interviessem, vou assim dizer, fadas e gênios, á feição dos famigerados íncubus e súcubos (Malleus malleficarum) da literatura eclesiástica medieval? Por que e como na realidade, o instantâneo dardo de cupido — o deus doidivanas e cego — decide num momento o futuro inteiro dos que foram por ele feridos? 
   

   Eis-nos, aqui outra vez e sempre, às voltas com o problema do amor, o eterno amor, no qual, mais que nenhum outro, atuam em nosso derredor os seres invisíveis do submundo e do supra mundo, como diria o grande teósofo português Visconde de Figanière.

Amor, nervo todo do imenso poema em prosa dos pares primitivos, maior do que a morte, pois que mata dando vida. 

Amor, assim, igual ao do sagrado lar dos ários, onde o brahmim ou pater familiae é sacerdote em companhia da mulher, filha, filho, e até do estrangeiro protegido. 

Amor sublimado que se eleva acima do próprio sexo, em símbolos e emblemas transcendentes de um mundo superior ou Jina, que nos aguarda piedosamente. 



Amor, afinal, que, depois desse solene dia do abandono de nossa carne, a filha e mãe do sexo, nos faz descerrar coma morte o casto mistério de As mil e Uma noites, ou seja, bem traduzido, O Véu de Isis. 




Nenhum comentário:

Postar um comentário